"O Eunuco de Inês de Castro" de Armando Nascimento Rosa
Encenação de Paulo Alves Pereira
ENTRADA LIVRE MEDIANTE RESERVAS: 91 599 27 47
“O Eunuco de Inês de Castro” de Armando Nascimento Rosa, pela sua dimensão poética, foi o texto escolhido este ano, para ser trabalhado na unidade curricular “Projeto de Dramaturgia Portuguesa”. Se, por um lado, a transversalidade no tempo e no espaço assume uma posição de relevo em toda a peça, a encenação antinaturalista procura salientar a intersecção da poética do autor com os arquétipos da nossa identidade. Os pequenos excertos de, ou a partir de, Friedrich Nietzsche, colocados como textos estranhos à peça, têm como objetivo, não o acrescentar algo ao autor, pois disso ele não precisa. São antes, de mais, uma provocação ao espectador, uma procura de quebra, não com o sentido poético do texto de base, mas sobretudo com a história tão paradigmática e de todos conhecida na sua versão romântica e trazê-la de forma mais radical para a agenda de discussão dos temas do quotidiano. Isto, porque, por vezes, enaltecemos apenas a fachada, as luzes de néon e o papel celofane dos embrulhos, e não queremos ver para além dessa aparência. Por detrás de um mito histórico, tão glosado, esconde-se um déspota e assassino que foi rei um dia no país que habitamos.
A cena abre-se para nos mostrar um cenário ambíguo: Teatro, ou Realidade? Teatro no Teatro?
Tão depressa nos é sugerido um misterioso “mundo dos mortos”, pululado de ilhas, como se de uma Veneza mítica se tratasse, como nos é proposto um salto para uma meta teatral, como se aqui se pudesse encontrar a remissão para todos os males.
Embora, como pano de fundo, a história nos possibilite entrever uma batalha campal, que nem os séculos transcorridos conseguiram apagar, é no destino de um tal Afonso Madeira, escudeiro do rei e uma das suas muitas vítimas, que esta mesma história está ancorada. Com efeito, depois de todas as atrocidades e vilanias que Pedro cometeu após a sua morte, Inês não consegue esquecer e muito menos perdoar tão hediondos excessos. Deste modo, o que resta é a ruína de um amor mítico, o qual, desde há muito, perdeu o seu carácter arrebatado, para se transformar numa relação de ódio eterno.
Afonso Madeira, o elo de relacionamento entre todos os fantasmas que habitam o palco, tenta, apesar do muito que sofreu, reconstruir o mito de Pedro e Inês, e procura uni-los novamente, servindo-se de todos os estratagemas, incluindo do poder catártico do teatro. Contudo, no “mundo do além” o tempo não se mede em horas e Inês mantem-se inabalável perante o ódio que nutre para com Pedro.
Em termos de fábula pretendemos refletir sobre as manipulações em nome do poder. O establishment está muitas vezes semeado de gente a quem nada, nem ninguém a impede de utilizarem as mais ignominiosas estratégias para atingirem os seus fins."
Paulo Alves Pereira